31 de outubro de 2011

Jakob Von Gunten - um diário

Companhia das Letras - Capa: Victor Burton
Caros leitores e leitoras, isto é literatura com L maiúsculo: aclamado pela crítica e desconhecido pela população em geral. Ou: quem já tinha ouvido falar sobre Robert Walser, o autor suiço que tanto influenciou Kafka, a ponto de dizerem sobre esse último que esse era só um caso  particular de Walser? (No entanto, ou talvez por isso, é "A metamorfose" que lemos na escola.)

Este é o próximo livro do meu clube de leitura, e por isso que ele caiu em minhas mãos. É uma leitura de dois dias, mas isso não quer dizer que ela seja simples - é complexa principalmente do ponto de vista psicológico. Nesse diário do Jakob Von Gunten, vamos descobrindo sobre sua vida e seu ambiente através de pensamentos e fatos narrados sem que haja uma pausa para explicar as circunstâncias, ou que haja alguma dúvida que sim, estamos lidando com um narrador parcial e não onisciente, e essa é a sua visão particular do mundo - estamos usando seus olhos e sua mente para ver, por mais estranho que nos pareça a realidade através dos olhos de outrem tão diferente de nós.

O ambiente em questão é uma escola para moços se tornarem serviçais. Então vemos Jakob, a admiração que ele sente por Klaus (o aluno mais dedicado e humilde, com mais vocação para servir) que não o impede de o atazanar pelas mesmas razões, a paixão (se eu posso dizer isso) que ele tem pela mestra, e o estranho relacionamento com o irmão desta última, que também é o diretor da instituição Benjamenta.

Este livro é daqueles para estudar, analisar por trechos, identificar as críticas a socidade, a moral e a ética correntes, destrinchar os relacionamentos humanos e tudo o mais - mas eu simplesmente o li. Considerei a história muito integrante, assim como a experiência de conhecer a intimidade de outro ser, mas não tenho análises profundas a oferecer. Um dos trechos que eu mais gostei, é corriqueiro de tudo: a descrição dos alunos "prestando atenção" numa aula, em que tudo é postura e aparência, quando provavelmente a mente está longe, longe... Isso sim, é algo que muitos de nós, de tantas idades diferentes, pode se identificar.




25 de outubro de 2011

Uma canção de Fogo e Gelo (livros 1, 2 e 3)

 
Bantam Books

Eu estive lendo a série "Uma canção de fogo e gelo" pelas últimas 5 semanas e cheguei até o final do terceiro livro. Porque sim, os livros são pequenos tijolos de centenas de páginas e isso leva um tempo.

Para quem não sabe do que eu estou falando, esses são os livros que originaram a série Guerra dos Tronos do canal HBO, que está na 2a temporada agora, e que  motivou as vendas dos livros (já que o primeiro foi lançado há mais de 15 anos). Aqui no Brasil já tem 3 publicados, mas eu consegui a pechincha de comprar os 4 livros juntos, em inglês, pelo Kindle, por 18 dólares. #recomendo

Enquanto eu lia, comecei a procurar outras pessoas lendo e assistindo a mesma série - porque ela parece novela, dá vontade de comentar as cenas do último capítulo. São muitas as reviravoltas e surpresa sque o autor nos reserva, numa velocidade incrível, então dá muita vontade de falar: "Você viu o que aconteceu com fulano?? Eu nem desconfiava!!!" (Por experiência própria, garanta que a pessoa já tenha lido o que você quer comentar, é chato fazer / descobrir spoiler desse livro.)

Um dos motivos de eu parar de ler agora no 3o livro é este: esperar outras pessoas chegarem no ponto que eu estou, para comentar comigo (vai, vai, começa a ler agora) e tentar me livrar da obsessão de só falar desse assunto: o mundo novo de Westeros.

Outro fato importante a saber é que o autor não tem dó nenhuma de matar personagens e sim, isso depois de você se apegar tanto a eles (porque os bonzinhos simpáticos também morrem, parece que até numa frequência maior do que os mauzinhos), que você fica realmente triste de ver isso acontecer.

O autor, George R. R. Martín, já publicou 5 livros dessa série e prometeu mais 2, então eu estou só na torcida pelos meus personagens favoritos para saber quais deles irão sobreviver, principalmente a Arya, que é uma garota impressionante.

Por fim, essa série foi associada ao Senhor dos Anéis e eu gostei muito da comparação que foi feita aqui, que defende que esses livros são melhores do que os da série famosa Tolkien - eu gostei da saga do Frodo, mas eu concordo com (quase todos) os argumentos dados, e estou achando essa série mais divertida que Senhor dos Anéis mesmo.

Aguardemos os próximos capítulos!

19 de outubro de 2011

Antes de nascer o mundo

Editora Companhia das Letras - Capa: Rita da Costa Aguiar
Tudo começou com a vontade de encontrar mais interlocutores para falar de livros (uma das motivações básicas desse blog também, assim como a divulgação da literatura). Em uma busca na internet por "clube de livros", encontrei o site da Companhia das Letras, com divulgação de várias datas e locais de reunião (inclusive por skype). Considerei bem o nome do autor: "Mia Couto", imaginei ser uma escritora brasileira, e enviei email para me inscrever.

(Três dias depois, é publicada a reportagem da Veja citando justamente esses clubes que começam a se espalhar pela cidade).

Quando fui procurar o livro para comprar, qual a minha surpresa ao descobrir que a brasileira Mia Couto era na verdade um escritor de Moçambique?

No interior de um país (não definido), mora um pai, dois filhos, um agregado, e um tio que vem e que vai. O filho mais novo, Mwanito, por volta de 9 anos, nunca viu o "mundo lá fora", que supostamente acabou - segundo afirmação do pai. Eles foram para esse lugar isolado, depois da morte da mãe, e estão num ambiente criado pela vontade do pai: ele batizou o lugar de Jesusalém (assim mesmo, dizendo que Jesus vai nascer ali de novo), mudou o nome das pessoas do pequeno clã para lhe dar mais significado, e dita as regras que ali reinam. A crise acontece quando chega uma mulher de fora, estremecendo o frágil equilíbrio daquelas relações familiares.

O livro, embora em prosa, é pura poesia. Totalmente lírico, cheio de metáforas que nos apresenta um mundo diferente e encantandor. Mwanito nunca viu uma mulher, e poder vê-lo descrevendo o seu espanto e admiração é algo incrível.

"Foi então que sucedeu a aparição: surgida do nada, emergiu a mulher. Uma fenda se abriu a meus pés e um rio de fumo me neblinou. A visão da criatura fez que, de repente, o mundo transbordasse das fronteiras que eu tão bem conhecia."

Eu lembrei um pouco do Guimarães Rosa ao ler o livro, a mesma cadência musical de leitura, a maneira tão poética e figurada dos personagens falarem, e depois descobri que ele é uma grande influência do Mia Couto mesmo.

A conversa sobre o livro, onde obtive essa informação e outras, ocorreu nessa segunda, num grupo de 10 pessoas (sendo só um homem). O papo fluiu leve, sem nenhum acadêmico fazendo dissertação, um só compartilhar de sensações e impressões. Foi uma experiência muito boa - o livro, o clube do livro - então decidi que vou voltar. Por que você não se aventura também?

15 de outubro de 2011

As cinco linguagens do amor

Editora Mundo Cristão - Capa: Celso Carpigiani

Se eu fosse indicar 2 livros para casais recém casados (ou quase casando, ou mesmo muito depois), eu escolheria Casais inteligentes enriquecem juntos e esse aqui: "As cinco linguagens do amor", de Gary Chapman.

Sim, é um livro de auto-ajuda. Sim, ele oferece uma "modelagem" do ser humano em que não necessariamente todo ser humano vai se "achar" (eu já vi acontecer), mas ele pode ser um ampliador de visão no que tange o relacionamento entre um homem e uma mulher.

O autor criou uma teoria de que há 5 formas de você se sentir amado (ou demonstrar seu amor), e ele colocou nomes simpáticos para isso: Qualidade do Tempo, Toque Físico, Receber Presentes, Formas de Servir, Palavras de Afirmação. Cada pessoa tem sua forma preferencial, que "enche o tanque emocional" mais rapidamente. Então, se você gosta de ser elogiado em público, ouvir palavras bonitas sobre si mesmo (Palavras de afirmação), se o seu cônjuge lhe encher de presentes (Receber Presentes) não vai ter o mesmo efeito do que se ele fizesse um simples (e barato) elogio.

A questão é que a gente tende a querer amar os outros como é bom para si mesmo (e isso tem a ver um pouco com o histórico familiar). Se a mulher acha que a forma de ela dedicar seu amor para o marido é servindo-o (faz a comida, lava a louça, lava a roupa, passa, limpa a casa, etc - Formas de Servir), mas na verdade tudo que ele quer é que ela pare e fique do lado dele, tranquila, conversando (Qualidade de Tempo) ou fazendo carinho (Toque Físico) há um descompasso na vida desse casal. Ela faz muito esforço em uma área, sem ter muito retorno (ele se sentir amado e valorizado), enquanto algo mais simples teria um efeito bem melhor.

Gary Chapman é um pastor cristão, mas ele também é um psicólogo e antropólogo, e escreve o livro principalmente sobre essa perspectiva, então eu acho que pode funcionar para (praticamente) todo mundo. Ele possui um site voltado para casamento e vida familiar, se você quiser fuçar.

Existem outros livros escritos sobre a mesma temática: As 5 linguagens do Amor de Deus, As 5 linguagens do Amor da Criança, do Adolescente, etc, mas esses eu não li e eu acredito que seja empolgação editorial mesmo. Dá para você expandir o que você lê nesse livro para outros aspectos da sua vida facilmente (como com irmãos ou amigos).

Esse é um livro que vale a pena ler só pelo retorno imenso e real que pode ter em uma das áreas mais importantes da vida de alguém: a vida compartilhada com seu amor.



12 de outubro de 2011

Di-versos...

Editora Scipione

 Para comemorar o dia das crianças, literatura infantil. No embalo do prêmio nobel de 2011, que escreve poesia que nunca poderemos ler no original, lembro dessa coleção de poesias russas, hebraicas e alemães, traduzidas e ilustradas para encantar crianças brasileiras.

A tradução é de Tatiana Belinky, uma autora maravilhosa para crianças, junto com Mira Perlov na edição de poemas hebraicos, e ilustrações lindíssimas da Cláudia Scatmacchia. Esses livros me encataram demais na minha infância, com menos de 10 anos mesmo, e me inspiraram a escrever meus próprios versos, até sobre as mesmas temáticas - notas de boletim, sinais de pontuação, meninos desobedientes, festa de bonecas, pescaria, passarinhos, os pais e até a morte - temas que conversam com crianças do mundo todo.

Em fases darks, minha poesia preferida era de Goethe (o próprio), "O Rei da Floresta", em que um pai cavalga pela floresta com a criança doente delirando no colo (achei nesse blog aqui, mas a versão do livro rima em português, é mais musical e numa linguagem acessível para crianças, realmente). Mas eu gostava e gosto até hoje de uma bem mais leve e engraçadinha, também de um alemão, chamado Wilhelm Busch, que deixo aqui com vocês.

Três tias

A primeira tia disse:
- Precisamos já pensar
Pra Soninha, nos seus anos,
Que presente vamos dar.

Então disse a segunda:
- Minha ideia, irmãs, é esta:
Um vestido verde-ervilha.
Essa cor Sônia detesta!

A terceira diz: - Concordo!
Verde a irrita pra valer!
Ela vai ficar furiosa.
Mas terá de agradecer!

6 de outubro de 2011

Tomas Tranströmer


Tomas Tranströmer, esse senhor simpático, é o ganhador do prêmio Nobel de literatura de 2011, acabaram de anunciar - e já atualizaram a wikipedia. :)

Uma breve pesquisa na internet e eu posso informar a vocês: ele é um poeta sueco, de 80 anos, sofreu um derrame 20 anos atrás que trouxe a ele dificuldades de fala, mas ele continua escrevendo, tendo sido um dos favoritos para o prêmio nobel do ano passado, inclusive. Segundo o anúncio, ganhou o prêmio esse ano porque suas "imagens condensadas e translucentes nos dão um acesso renovado a realidade".

É muito legal que um poeta ganhe o prêmio Nobel, talvez num momento que esse gênero esteja um pouco desvalorizado. No entanto, poesia é o gênero que mais sofre com a barreira da tradução, na minha opinião. O tradutor é um pouco autor também, para escolher as palavras, preservar a musicalidade, e a estética da obra. E, nesse caso, acredito que muitas poucas pessoas poderão ter acesso aos originais, em sueco.

De qualquer forma, para quem ter um gostinho da obra em inglês:

Now the evening star burns through cloud.
Trees, fences and houses grow, grow larger
with the dark’s soundless, steepening fall.
And under the star is outlined clear and clearer
the other, secret landscape that lives
the life of contour on night’s X-ray plate.
A shadow draws its sled between the houses,
They wait.
[“Epilogue,” from 17 dikter, translated by May Swenson]

3 de outubro de 2011

Dom Casmurro

Editora Saraiva de Bolso
A Heloiza do blog Aprendendo com as diferenças me surpreendeu dia desses ao dizer que adora os clássicos. Convenhamos, quantas pessoas jovens como ela saem dizendo isso por aí? A moda é gostar de vampiros e adolescentes assanhadas, magia, mistérios ou chick lit (nada contra, realmente, eu gosto também bastante desse tipo de coisa).

Todo mundo gosta de culpar a escola, por tornar os nossos clássicos da literatura, tão obrigatórios e maçantes pelo repúdio que muita gente tem por eles, mas eu acredito que a mesma escola, com uma abordagem não convencional, pode fazer o contrário.

Machado de Assis, em toda sua genialidade, não é um autor fácil de engolir aos 14 anos. É difícil apreciar suas sutilezas e sua análise da natureza humana, toda a fotagrafia que ele fez de uma sociedade que passou, e é bem diferente da atual.

Quando a professora sugeriu que fizéssemos um tribunal para a Capitu, baseando-nos somente no próprio livro Dom Casmurro (que, como vocês sabem, foi escrito na perspectiva do próprio corno - ou não), eu pulei na oportunidade de defendê-la - o que era realmente o desafio.

Lá fui eu então reler o livro, cuidadosamente, destrichando o texto, lendo nas entrelinhas, buscando pegar o narrador no pulo, traído por suas próprias palavras (e não pela Capitu, é claro). Não foi difícil encontrar vários argumentos, vários pontos de dúvidas (e olha que eu nem tenho talento para o direito), para usar numa discussão acalorada na sala de aula que, se não me falha a memória, terminou em empate...

Mas a vitória foi minha, de realmente apreciar um livro que merece ser estudado com vontade, e não por obrigação.