27 de setembro de 2011

Leite Derramado

Editora Companhia das Letras - Capa warrakloureiro

Muitos conhecem o Chico Buarque compositor, mas nem tanto o Chico escritor de livros. Sobre a leva recente - Estorvo, Benjamim, Budapeste e este último, que já tem dois anos - ele foi elogiado, criticado e virou filme. Tecnicalidades a parte, eu gostei de tudo o que eu li dele e tenho um carinho muito grande por este "Leite Derramado".

No livro, um homem idoso numa cama de hospital vai lembrando da sua vida, misturando seu passado com o que está acontecendo agora, derramando um monólogo não linear que simpatiza o leitor com aquele senhorzinho. São anos de história que se passam por diferentes épocas do Brasil, e embora tenha o contexto geral, trata-se de uma narrativa familiar.

Quem tem senhores de uma certa idade na famíla - avós, tio-avós, pais - sabe como pode ser encantador ouvir histórias de antigamente, mesmo que eles se confundam, se lembrem só de uma parte, se interrompam ou esqueçam repentinamente do que estão falando. É a arte de contar estórias, que não fazem parte de livro algum, e talvez nunca farão, mas fazem parte da nossa história pessoal como filhos, netos, família.

Nisso, nos identificamos com o livro, pelo velhinho ou velhinha que temos em casa, ou pelo velhinho ou velhinha que um dia iremos ser.

E sabemos que, às vezes, adianta chorar num admirar-se e emocionar-se por um leite derramado da vida de alguém...

21 de setembro de 2011

O Mundo de Sofia

Companhia das Letras - Capa: Silvia Ribeiro

Esse considero esse livro um clássico. Pode não ser uma obra prima da literatura como de autores renomados que estamos acostumados a chamar de clássicos, mas tanto pela sua abrangência mundial e por não perder seu atrativo com a passagem de tempo (mesmo tendo só uns 15 anos, adolescente ainda).

 Quem já passou pela 3a década da vida (ou está nela) deve lembrar do sucesso que foi "O Mundo de Sofia" na época do lançamento. Sucesso de crítica e de vendas, mesmo com os 3 fatores contra: sobre filosofia, de um autor norueguês nada conhecido e um tijolo.

A verdade é que muita gente comprou, mas não sei se toda essa gente leu. Ou leu inteiro, as mais de 500 páginas. Mas tenho certeza que serviu para popularizar por aqui, relativamente, o autor Jostein Gaarder, que teve outros muitos livros publicados no Brasil, inclusive O Dia do Curinga.

 Nesse livro, existe a estória, com a Sofia, seu pai viajante e o seu professor misterioso de filosofia. E existe a história da filosofia, desde a concepção da própria e os primeiros pensadores sobre a vida e o sentido de tudo. No começo, são cartas - até a letra é diferente no livro - e depois são diálogos, também facilmente identificáveis. A história e a estória conversam entre si num certo nível, mas também dá para ler só a estória, pulando toda a parte didática da filosofia e se você não tem muita paciência para o tema, essa é uma das opções para "ler" o livro, pelo menos aproveita-se o enredo.

Esse livro funciona mesmo para quem quer conhecer um pouco de filosofia, saber mais ou menos quem foi e o que falou gente como Hegel, Nietzche, Sócrates, etc, mas sem se emaranhar muito pelo assunto - estudar seriamente filosofia demandaria um esforço bem maior, o qual, acredito, nem todos gostariam de exercer.

18 de setembro de 2011

O Tambor

Editora Nova Fronteira
Em 1999, Gunter Grass ganhou o prêmio Nobel de Literatura e a sua principal obra de referência era "O Tambor". Curiosa a respeito do mais novo laureado, alemão, peguei esse livro na Biblioteca Municipal de Valinhos. Na hora de passar pelo balcão, a senhora comenta: "Que engraçado, ninguém pegava esse livro há 10 anos e você é a terceira nesse mês." E eu: "É que o autor acabou de ganhar o prêmio Nobel". E ela: "Ah...".

Essa pequena anedota diz duas coisas:

1) Pessoas que trabalham em biblioteca não necessariamente gostam de livros e todo o seu mundo.

2) Livros de Nobel são assim: passam anos ignorados pela população em geral, até serem popularizados por algum instante. (Se alguém conhece a biblioteca de Valinhos, vai lá ver para mim desde quando ninguém lê esse livro, por favor).


Eu não  me lembrava com detalhes da história, mas a wikipedia me ajudou. O livro são as memórias de um anão, que está num asilo na década de 50, desde o seu nascimento na Polônia. É ele que toca o tambor, inclusive para entreter as tropas nazistas numa "trupe de anões". O livro foi escrito bem naquela época, então é um retrato da sociedade alemã contemporânea - e o que os entendidos gostam de chamar de "crítica social".

Eu não gostei tanto assim para me empolgar de ler outros, mas foi interessante conhecer um Nobel - e a literatura alemã que nem é tão conhecida por aqui.

15 de setembro de 2011

They do it with mirrors

Signet
Agatha Christie? Amo, amo, amo.

Os livros dela são puro entretenimento, fáceis de usar para passar o tempo e distrair a mente.

Esse, com a fofa da Miss Marple, chama-se "They do it with mirrors" ou algo do tipo: "Eles usam espelhos para isso", mas que aqui no Brasil foi entitulado "Um passe de mágica". Tudo ocorre dentro da casa de uma família rica, com direito a mãe, marido, filha, neta, filhos do ex-marido, e várias mortes até tudo ser esclarecido (o que não é lá muito comum nos livros da autora). O nome remete ao teatro, em que truques de cenários são feitos com espelhos para criar uma ilusão (o que realmente se perdeu no título em português).

Eu gosto muito do clima dos livros da Agatha Christie e os seus personagens tão humanos e universais, mas por outro lado tão localizados no tempo e espaço da cultura inglesa do século XX. Recomendo para todo mundo que quiser ler algo para divertir-se com boa qualidade.

12 de setembro de 2011

Pegando Fogo!

Editora Record

Você pode ter certeza de que "cresceu" quando lê um livro que é para adolescentes e percebe que não existe mais nenhuma sintonia com ele. Isso acaba de acontecer comigo, com esse livro da Meg Cabot que eu peguei emprestado da minha prima de 15 anos.

Não é que não seja bem escrito e levemente divertido, uma leitura fácil para entretenimento, o que pegou mesmo é a constatação que sim, se eu tivesse 15 anos eu iria gostar muito mais desse livro, (mas talvez nem tanto como alguém que escreveu num blog que chora toda vez que lê, já não é para tanto, né???). Não sou adolescente faz anos, mas incrível como você percebe que o tempo passa não pelos dias do calendário mas por pequenas surpresas do cotidiano que lhe fazem constatar que você mudou, pelo simples processo de amadurecimento - ou envelhecimento mesmo.

Quem está pegando fogo nesse livro é a Katie Ellison, super pop numa pequena cidade litorânea, namora o artilheiro do time de futebol americano do colégio, beija um outro carinha de vez em quando, e desestabiliza quando chega de volta a cidade seu amigo de infância, que sim, também gosta dela. Sim, são todos lindos, sarados e maravilhosos. Sim, ela é linda. E inteligente, trabalha na lanchonete local, tira fotos ótimas, tem uma mania de mentir para fugir de algumas enrascadas (o que obviamente cria outras), mas o principal mesmo é que ela quer beijar. Qualquer linha de pensamento, qualquer diálogo que esteja rolando é interrompido por um "nossa, mas eu queria beijá-lo", "mas esses lábios", "mas quando a gente estava beijando"...

Ou seja, tem até um fundo moral, uma necessidade de passar uma mensagem a medida que se cria uma empatia com os adolescentes (seja pela realidade que eles vivem - nos Estados Unidos - ou o que eles queriam viver - o caso aqui no Brasil, acredito), mas no fim tudo se resume a pegação (e novamente, com certos limites, porque a Katie continua virgem por não estar com a pessoa certa).

Eu sei que existem bons livros para crianças e adolescentes, que valem para qualquer idade, e de vez em quando eu faço propaganda deles aqui, mas não é o caso desse. Vai demorar para eu me aventurar com Meg Cabot novamente. 

8 de setembro de 2011

Macunaíma

Editora Agir
Quem sentiu um frio na espinha e um cheiro de vestibular quando viu o nome desse livro?

O ensino brasileiro tem desse tipo de coisa, conseguir criar repulsa por obras de arte, como essa, de Mário de Andrade.

Quem estudou direitinho, para aprender e não decorar, deve lembrar que Macunaíma foi uma obra do modernismo, numa época de florescimento original da arte brasileira em todos os seus aspectos. Lançado em 1928, causou estranhamento tal como vem causando até hoje. Mário de Andrade pesquisou muitos mitos e folclores de todas as regiões do Brasil e formou essa colcha de retalhos em volta do índio Macunaíma, que representa todo o povo brasileiro.

Sendo sincera, eu sou bem quadradinha, e o livro é "muito louco", então eu e ele não nos tornamos grandes amigos, embora eu o admire muito pela construção do romance, assim como pela retratação da cultura brasileira. Já uma amiga minha morreu de rir durante toda a leitura, e eu tenho certeza que muita gente que se dispusse a abrir o livro, ou a  lê-lo sem preconceitos, também apreciaria muito.

E fica aí a citação do livro que eu gostei tanto, que nunca mais esqueci:

"Pouca saúde, muita saúva,
os males do Brasil são."

5 de setembro de 2011

Nó de ratos

Companhia das Letras - Capa: Ettore Bottini
Mais um livro policial da minha lista esse ano, dessa vez do inglês Michal Dibdin que escreve sobre um tal de Comissário Zen, que é italiano. Esse é o 1o livro sobre esse personagem, que é retirado do ostracismo de um cargo burocrático na instuição policial, para o qual tinha sido destinado após pisar em calos poderosos numa investigação. Ele vai para o interior da Itália investigar o sequestro de um chefão industrial, um caso permeado por tramas familiares e politicagem - o que a gente imagina da Itália mesmo da década de 90.

O que eu gostaria de comentar é sobre a que o título alude, uma expressão que eu só vi em outro livro além desse (Firmin, de Sam Savage). Em alguns momentos, a tradução é realmente "Nós de Ratos" em outros "Rataria", mas a expressão literal seria "Rei de Ratos" (o título em inglês é "Ratking" - esse é um link para a wikipedia com uma foto impressionante), originária do alemão "Rattenkonig", e se refere a um conjunto de ratos que ficam presos pela cauda, e sobrevivem assim mesmo. Todos grudados davam a impressão de serem um animal só, com vários corpos, e daí ser o "Rei dos Ratos".  (Pronto, um pouco de cultura geral para todos nós).

Aqui nesse livro, claro, se trata de uma metáfora para toda a trama que deixa o Comissário Zen confuso - aliás, ele parece a maior parte do tempo estar sendo levado pela maré, sem entender nada, até o gran finale. Mas é bem humano mesmo, com conflitos internos e nadinha de super herói ou Sherlock. Vale pela visão "de dentro" da sociedade italiana.