7 de março de 2012

La Liseuse

Mais uma resenha da Fér para vocês, um livro que não tem em português - ainda!
Editora P.O.L.

Escolhi este livro pelo nome : “liseuse” é a palavra que os franceses inventaram para o e-reader, aparelho que serve para ler livros em formatos eletrônicos. Ele foi lançado recentemente na França, eu não conhecia o autor, Paul Fournel, mas achei o título curioso e resolvi comprar a versão eletrônica para ler no meu Kindle – quer maneira mais adequada para ler um livro com este nome?
A “liseuse” em questão nada mais é do que um iPad (não está escrito com todas as letras, mas para bom entendedor...), entregue em um final de tarde de sexta-feira a Robert Dubois, editor, por uma estagiária da empresa. Ela explica que foi o “chefão” que mandou entregar, com todos os novos livros ainda não publicados que Robert deve analisar no final de semana ali dentro, e mostra como usar a novidade. Este é o ponto de partida do livro: o choque entre Robert, um editor à moda antiga, e a jovem estagiária trazendo um e-reader – será este o futuro do setor?
Nas páginas seguintes, vamos acompanhando Robert que descobre o funcionamento do aparelhinho, suas vantagens, suas desvantagens. Conhecemos sua esposa, que é assessora de imprensa de uma outra editora, cruzamos com alguns de seus escritores, seus colegas, vemos como funciona o mundo dos livros em Paris. Vemos Robert, talvez inspirado por seu e-reader, lançar um projeto inovador com os estagiários da empresa, rumo ao futuro do mercado editorial. O tempo e o livro vão avançando, sem a gente perceber – a leitura é deliciosa, frases bem construídas, coloridas, profundas. Para mim, as páginas em prosa pareciam pura poesia.
E aí, quando a história acaba, vem uma pequena página a mais onde o autor explica que o livro foi construído com a forma inspirada em uma sextina, forma poética inventada no século XII pelo trovador Arnaut Daniel e depois utilizada por poetas clássicos, como por exemplo Camões. Na sextina original, são seis estrofes de seis versos, e as palavras que terminam cada um dos seis primeiros versos voltam nas outras estrofes, seguindo o esquema de rima : ABCDEF – FAEBDC – CFDABE – ECBFAD – DEACFB – BDFECA. Em “La liseuse”, são 36 capítulos que substituem os versos. As palavras “lida”, “creme”, “editor”, “culpa”, “mim” e “noite” terminam os capítulos, seguindo o esquema de rima acima.  E, para completar, os versos/capítulos têm medida: os seis primeiros têm 7500 caracteres cada, os seis seguintes 6500, e assim até os seis últimos, com 2500 cada um. O autor conta que é porque os versos servem para contar a vida de um homem mortal, que é como “uma bola de neve derretendo”.
Quando li tudo isso no final, fiquei com vontade de estar com o livro na versão papel nas mãos, para poder voltar no final de cada capítulo, segurar várias páginas ao mesmo tempo entre os dedos e ver as mesmas palavras voltando de maneira cíclica. Quando li tudo isto, lembrei das aulas de redação e literatura do colégio, e dos tempos em que eu tentava escrever versos contando as sílabas. Quando li tudo isto, entendi a poesia que eu senti lendo o texto, e fiquei com vontade de ler tudo de novo. Livro de papel ou eletrônico, não importa, o que importa é o conteúdo. Como dizem os franceses, este livro foi um “coup de coeur” – apaixonei.
Se alguém conhece um editor por essas bandas tupiniquins, eu adoraria receber a missão de traduzi-lo para o português :-)

Um comentário:

  1. Fér!!! Eu muito lembro de você contando versos! Vc chegou a fazer um dodecassílabo, não? Acho que eu não tinha paciência para tanto (só para fazer poesias normais mesmo, hahahaha).

    Acho que esse vai ser o primeiro francês que eu vou ler no kindle! Mas daqui a alguns meses, depois da pilha aqui abaixar. :)

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